As relíquias da Catedral de Notre-Dame em Paris

Um cenário devastador. Assistir um lugar tão lindo, simbólico e parte da História da Humanidade em chamas é uma experiência dolorosa. Desde ontem, o sentimento é de consternação geral pelo incêndio que durou 9 horas num dos pontos mais famosos de Paris (e do mundo). Em seus 8 séculos, a Catedral de Notre-Dame viu dezenas de reis serem coroados, foi testemunha da Revolução Francesa, do coroamento de Napoleão Bonaparte e sobreviveu forte a duas guerras mundiais.

Nós do SUTR (assim como boa parte dos nossos leitores) já estivemos algumas vezes em Paris. A capital francesa, de história tão rica e preciosa, é de uma bela indescritível. O valor imensurável da Notre-Dame é apreciado por quase 13 milhões de visitantes todo ano. A catedral também entrou no imaginário coletivo por ser cenário do clássico “O Corcunda de Notre-Dame” (ou “Notre-Dame de Paris”), lançado em 1831 pelo escritor Victor Hugo (1802-1885) e eternizado com as diversas produções de sucesso nos cinemas. Agora, um certo vazio vai tomar conta de todos que visitarem a catedral que está situada na pequena ilha chamada Île de la Cité.

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A igreja, que fica rodeada pelas águas do rio Sena, é o marco zero da capital francesa e começou a ser construída em 1163. Levou mais de 180 anos em construção. Não é considerada a mais antiga da França, nem a maior ou a mais alta do mundo, mas certamente é uma das mais conhecidas. Além da fama  e da imponência de sua arquitetura gótica, ela guardava diversas relíquias. Pinturas, esculturas e vitrais tidos como obras-primas. Por lá, estavam os seguintes destaques: a réplica mais valiosa guardada, a da Santa Coroa, que católicos acreditam que foi usada por Jesus pouco antes de ser crucificado; outras duas relíquias da Paixão de Cristo: um pedaço da Cruz e um cravo.

Além deles, três órgãos, sendo que o maior, chamado de “grande órgão”, com seus cinco teclados e cerca de 8 mil tubos, era o maior relevante. Construído a partir do século XV, o órgão foi sendo ampliado progressivamente, até alcançar seu tamanho atual no século XVIII. Ainda não há informações sobre a situação dos órgãos. Segundo o reitor da catedral, a Santa Coroa escapou das chamas, assim como a túnica de São Luís, um dos reis mais famosos da França, que também é guardada na catedral.

Em outros episódios, a Notre-Dame também viu sua história ser apagada. Nos saques e invasões que ocorreram no local durante a Revolução Francesa e nos motins de 1831, algumas de suas obras-primas foram perdidas. Porém, seu tesouro litúrgico, que era um dos mais ricos da França até desaparecer em 1789, foi sendo reconstruído pouco a pouco. A Catedral de Note-Dame sempre foi considerada pela Igreja Católica uma de suas “fortalezas” de valor. 

Quando o fogo irrompeu no telhado da catedral de séculos de existência e rapidamente envolveu o pináculo, que desmoronou, nos arredores e nas ruas de Paris o sentimento era de extrema tristeza. Começando na parte superior da catedral, as chamas se propagaram rapidamente pelo o telhado. O fogo queimou o teto de madeira de mais de cem metros de comprimento, conhecido como “a floresta”, pelo grande número de vigas utilizadas para instalá-lo. Consumiu também os vitrais seculares e referências de um celebre período artístico. Todo o telhado e toda a armação foram destruídos, parte da abóbada e a “flecha” (torre mais alta) caíram. Cerca de 400 bombeiros foram mobilizados para conter as chamas.

O procurador de Paris, Remy Heitz, disse que acredita que o incêndio na Catedral de Notre-Dame possa ter sido ocasionado por um acidente. Nesta manhã, bombeiros e especialistas analisavam a estrutura da edificação e o impacto das chamas, com um anúncio inicial que parte da estrutura foi preservada.

O presidente francês, Emmanuel Macron, prometeu “reconstruir” a catedral. “Nós vamos reconstruir essa catedral, todos juntos. Uma campanha nacional vai ser lançada, e para além das nossas fronteiras. Nós faremos um chamado aos maiores talentos, que serão muitos e virão para reconstruir nossa Notre-Dame.” Além dele, o magnata francês François-Henri Pinault, dono do conglomerado de marcas de luxo como Gucci , Yves Saint-Laurent , Bottega Veneta , Balenciaga , Boucheron , Alexander McQueen e Stella McCartne, anunciou que vai doar 100 milhões de euros para a restauração da catedral. Temporariamente, algumas das obras de arte serão deslocadas para o Museu do Louvre. Nos próximos dias, o prédio deve começar a ser restaurado.

Um episódio dessa proporção nos faz lembrar ainda mais da importância de cada viagem, de cada lugar que passamos e que mergulhamos para conhecer os pequenos detalhes culturais. Reforça ainda a atenção e respeito que devemos ter pela História, sobre como, permanentemente, necessitamos exaltar a memória e valorizar a arte. Esse incêndio que consumiu uma das joias francesas faz com que tenhamos sempre em mente sobre a brevidade dos momentos. A Notre-Dame, de seus tantos anos de história e episódios importantes, infelizmente, nunca mais será mesma. Mas que a “nova” Catedral renasça abraçada por milhares de apaixonados!